Na tarde deste 29 de maio de 2021 o Chelsea sagrou-se bicampeão europeu e eu poderia usar esse texto para abordar diversos pontos de vistas diferentes em relação a essa final como os dois finalistas serem oriundos da mesma e principal liga europeia; ambos comprados por milionários e que investiram muito nos últimos anos; “gigantes” com pouca ou nenhuma tradição na competição, ou até mesmo os 90 minutos jogados em campo. Porém, vou olhar de outro ângulo.
O título foi do Chelsea e o vice do Manchester City, mas inúmeros nomes compõem essa história até chegarmos aos nomes dos clubes propriamente ditos. Quantos caminhos diferentes, superações, ambições, entre outros sentimentos envolviam cada um que participou dessa final?
Podemos começar pelos homens do banco.
De um lado, Guardiola, que indiscutivelmente é um dos maiores treinadores da história, mas que em 6 anos no comando da equipe, ainda convive com a pedra no sapato que é colocar o nome do City em uma “Orelhuda”. Por outro lado, o alemão Thomas Tuchel precisou de apenas 5 meses à frente dos Blues para sagrar-se campeão com números e apresentações expressivas em sua campanha, nesta que foi sua segunda final de Champions seguida, já que era o treinador do PSG, finalista em 2019/2020.
Outros personagens tem histórias emocionantes muito antes de pensar em ser campeão da Europa. Como deve estar a cabeça de Édouard Mendy? O camisa 16 do Chelsea não só se tornou o primeiro goleiro africano a ser campeão europeu como titular, mas teve certeza que a decisão de seguir sua carreira quando estava sem clube e tendo como única opção de renda uma proposta de se tornar vendedor de roupas em um shopping, foi a mais acertada possível. Do recomeço na segunda divisão da França, o aval de Petr Cech para chegar ao Chelsea e barrar o goleiro mais caro da história. Se isso não é uma história encorajadora, eu realmente não sei o que é.
Se anos atrás a vida estava difícil para o arqueiro dos Blues, ela também foi no mínimo inusitada para o autor do gol do título. Em 2017, o então atacante promissor, Kai Havertz, foi proibido de participar de um jogo decisivo da Champions League quando ainda defendia o Bayer Leverkusen, por ter uma prova importante no colégio e seu time acabou sendo eliminado. 4 anos depois, ele dá o título ao Chelsea com o seu único gol marcado na competição. Precisava ter feito mais?
“- Ir para um time como o Chelsea é um sonho, mas agora eu tenho que trabalhar para alcançar o nível que é necessário para jogar aqui.”
Sabe de quem foi essa frase? Kevin De Bruyne, ao chegar no Chelsea em 2012. Muitos podem não saber, mas seu primeiro clube fora da Bélgica, seu país natal, foi os Blues. Poucas oportunidades e lesões fez o meia não ter sucesso no clube e foi reencontrar seu futebol na Alemanha até chegar ao City, onde hoje é tido por muitos como o melhor meia do mundo. O jogo de hoje poderia servir não só para mostrar ao Chelsea que um pouco mais de paciência poderia ter feito muita diferença, mas também para, quem sabe, consagrar uma temporada impecável do meia que vive flertando com a tal Bola de Ouro. Só que com o olho inchado após choque com o zagueiro Rüdiger, o belga deixou o gramado e o campo antes do apito final e com uma atuação bem abaixo das expectativas. Aliás, olho inchado é o que mais deve ser ver no vestiário do Manchester City após o apito final.
Falando em Bola de Ouro, eu seria muito louco se pensassem no onipresente Kanté para concorrer a tal prêmio? O que vem jogando ano a ano o volante francês é de se aplaudir de pé. E se não bastasse nos encantar em campo, sua história de superação e crescimento é digna de um filme. Do lixo ao luxo, N’Golo Kanté que subiu degrau em degrau na sua vida, teve que voltar a escada para pisar em um degrau que havia pulado ao ganhar a Copa do Mundo em 2018, e resgatou o que faltava, a Liga dos Campeões da Europa. A palavra “exemplo” no dicionário parece ter ganho outro significado.
Para nós brasileiros a final teve um olhar diferente do imaginado. Enquanto a expectativa de muitos era um #NeyDay no Estádio do Dragão, a realidade foi mostrado por jogadores como Thiago Silva, que entrou na lista dos brasileiros campeões da Europa; Fernandinho, aclamado pela torcida e que em caso de vitória do City seria o primeiro brasileiro a levantar o caneco; Gabriel Jesus e Ederson, donos de vagas cativas entre os convocados de Tite; fora os que “deixamos escapar” como Jorginho e Emerson Palmieri, naturalizados italianos.
Outro que teve um gosto diferente e amargo nessa final foi Sergio Agüero. Maior artilheiro da história dos Cityzens, o argentino fez sua última partida pelo clube e, com certeza, não era com a perda do título que ele gostaria de ter encerrado uma passagem que durou 10 anos vestindo a mesma camisa.
Poderia me alongar com Timo Werner que poderia ser vilão do jogo devido as oportunidades desperdiçadas caso o caneco não fosse levantado por Azpilicueta, que aliás, outro que daria uma boa história. Por que não falar de Mason Mount, que está no clube desde os 4 anos de idade e certamente sente um gosto muito mais especial que vários deste elenco? Mas paro por aqui.
O objetivo é mostrar que por trás de 11 jogadores de cada lado, exercendo sua profissão enquanto o mundo todo acompanha e escolhe o seu lado, existe uma história muito própria, capaz de fazer o sentido de coletivo se tornar individual e singular. Isso é o futebol!